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Mycoplasma hyopneumoniae: o vilão esquecido que continua causando prejuízos

  • Foto do escritor: Karina Sonalio
    Karina Sonalio
  • 29 de abr.
  • 4 min de leitura

As doenças respiratórias representam um grande desafio para a suinocultura global, com Mycoplasma hyopneumoniae (M. hyopneumoniae) se destacando como agente causador da pneumonia enzoótica e um dos principais patógenos envolvidos no Complexo de Doenças Respiratórias Suínas (CDRS). Esse patógeno respiratório crônico infecta mais de 70% dos rebanhos suínos no mundo, resultando em redução nas taxas de crescimento, aumento dos custos com tratamentos e maior vulnerabilidade a infecções secundárias. Sua natureza silenciosa — caracterizada por alta morbidade e baixa mortalidade — permite que os suínos aparentem estar saudáveis enquanto geram prejuízos econômicos, como a redução de US$ 6,55 no lucro por animal observada em rebanhos afetados (Ferraz et al., 2020). Transmitido de forma indireta (aerossóis) ou contato direto (animal infectado), M. hyopneumoniae pode estar presente em todas as fases de sistemas de produção, sobrevivendo por dias em poeira e ambientes frios, facilitando a sua disseminação.


Como membro da classe Mollicutes, M. hyopneumoniae não possui parede celular, tornando-o resistente a antibióticos beta-lactâmicos. Seu pequeno genoma (580–1.350 kb) e dependência de nutrientes do hospedeiro dificultam seu cultivo em laboratório. A virulência da bactéria reside em sua capacidade de colonizar o epitélio ciliado respiratório usando adesinas como P97 e P102, que comprometem a depuração mucociliar — um mecanismo de defesa crítico. Esses danos abrem portas para outros patógenos primários e secundários, como Pasteurella multocida, Glaesserella parasuis, Actinobacillus pleuropneumoniae, circovírus suíno tipo 2 (PCV2), e o vírus da Síndrome Reprodutiva e Respiratória dos Suínos (PRSSV), na qual o Brasil é livre. Além disso, M. hyopneumoniae induz a supressão de citocinas anti-inflamatórias (como IL-10) e promove inflamação prolongada através do aumento de sinais pró-inflamatórios (IL-1β, TNF-α), agravando as lesões pulmonares.


Os suínos infectados geralmente apresentam tosse seca persistente, evoluindo para dispneia, febre e atraso no crescimento, principalmente quando ocorrem infecções secundárias. No abate, observa-se consolidação cranioventral pulmonar — lesões firmes, avermelhadas a acinzentadas nos lobos apicais (Figura). Microscopicamente, as lesões evoluem através de infiltração de neutrófilos, acúmulo de fluido alveolar, hiperplasia linfoide e fibrose.


Além disso, a complexidade das infecções respiratórias é ainda maior quando M. hyopneumoniae está presente, amplificando significativamente a gravidade das coinfecções. Por exemplo, quando associada ao vírus PRRSV, a bactéria prolonga a duração da pneumonia e intensifica a replicação viral, prolongando o curso clínico da infecção. Em casos de coinfecção com PCV2, observa-se um agravamento da depleção linfoide e dos danos teciduais pulmonares, comprometendo ainda mais a resposta imune dos animais. Além disso, a interação com Actinobacillus pleuropneumoniae desencadeia sinais clínicos severos, como febre alta e mortalidade elevada, devido à sinergia entre os patógenos. Essas interações evidenciam o papel central de M. hyopneumoniae em debilitar as defesas respiratórias locais, facilitando a colonização por outros agentes e exacerbando lesões. Como consequência, os rebanhos suínos tornam-se mais suscetíveis a crises sanitárias, especialmente durante as fases de recria e terminação, períodos críticos em que fatores estressantes e alta densidade populacional favorecem a disseminação de infecções. Dessa forma, o diagnóstico e controle eficaz desse agente é essencial para mitigar impactos econômicos e sanitários no sistema produtivo.


O diagnóstico preciso pode envolver uma combinação de métodos tradicionais, como PCR e ELISA, e técnicas inovadoras, como sequenciamento e metagenômica. A PCR/qPCR é eficaz na detecção do DNA bacteriano em amostras biológicas, incluindo swabs traqueobrônquicos, swabs de laringe, lavados broncoalveolares e tecido pulmonar. A técnica de ELISA, por sua vez, identifica anticorpos contra o agente patogênico, embora possa ocorrer reação cruzada com micoplasmas não patogênicos, como M. flocculare. Já a metagenômica, que utiliza o sequenciamento, permite identificar alterações no microbioma respiratório associadas à infecção, oferecendo uma visão mais ampla do impacto microbiano na saúde pulmonar.


Embora os antimicrobianos, como tetraciclinas e macrolídeos, sejam comumente utilizados no tratamento de infecções por M. hyopneumoniae, o uso excessivo e indiscriminado desses medicamentos tem sido associado ao desenvolvimento de resistência bacteriana, o que tem levado a um maior enfoque na prevenção das infecções.


Nesse contexto, a vacinação emerge como a principal medida de controle, sendo uma estratégia eficaz para reduzir a carga bacteriana e as lesões pulmonares, embora não seja capaz de impedir completamente a infecção. Nos últimos anos, as vacinas autógenas, feitas sob medida com cepas específicas do rebanho, têm se destacado como uma abordagem alternativa para enfrentar os desafios impostos pela diversidade antigênica e pela variabilidade regional das cepas. Diferente das vacinas comerciais, que utilizam cepas de referência padronizadas, as vacinas autógenas são formuladas com base em isolados coletados de suínos infectados dentro de um rebanho específico, proporcionando um alinhamento antigênico mais preciso entre a vacina e as cepas circulantes no campo. Dessa forma, as vacinas autógenas se apresentam como uma ferramenta flexível no controle de M. hyopneumoniae, especialmente para rebanhos com perfis de cepas exclusivos ou falhas recorrentes nas vacinas comerciais.


Além da vacinação, práticas de manejo adequadas são essenciais para o controle de M. hyopneumoniae. O sistema de "tudo dentro/tudo fora" limita a disseminação do patógeno entre lotes, e a aclimatação das leitoas às cepas específicas da granja reduz a transmissão vertical e fortalece a imunidade. A otimização do ambiente, com a redução de amônia e poeira, melhora a saúde respiratória. A erradicação do agente, por meio de fechamento do rebanho, medicação estratégica ou despovoamento, tem mostrado sucesso, especialmente na Europa e América do Norte, com redução do uso de antibióticos e aumento da produtividade. Contudo, em áreas de alta densidade populacional, o risco de reinfecção permanece, exigindo rigorosas medidas de biosseguridade.


Por fim, o impacto econômico e sanitário de M. hyopneumoniae exige a adoção de estratégias integradas, que envolvam a combinação de medidas como vacinação, diagnóstico, controle e biosseguridade. Para os produtores, investir no controle da infecção vai além de uma questão de saúde, representando uma decisão estratégica que pode melhorar a sustentabilidade e a lucratividade da produção suína. Ao compreender melhor a biologia do agente e utilizar ferramentas modernas e específicas, a indústria pode mitigar essa ameaça persistente e proteger a saúde dos rebanhos.


Figura: Pulmão suíno sem lesões de consolidação (A) e apresentando consolidação pulmonar cranioventral (B), indicadas pelas setas brancas.
Figura: Pulmão suíno sem lesões de consolidação (A) e apresentando consolidação pulmonar cranioventral (B), indicadas pelas setas brancas.

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